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O Comissário apertou-lhe mais a mão, querendo transmitir-lhe o sopro de vida


O Comissário apertou-lhe mais a mão, querendo transmitir-lhe o sopro de vida. Mas a vida de Sem Medo esvaía-se para o solo do Mayombe, misturando-se às folhas em decomposição.

 […]

Mas o Comissário não ouviu o que o Comandante disse.

Os lábios já mal se moviam.

A amoreira gigante à sua frente. O tronco destaca-se do sincretismo da mata, mas se eu percorrer com os olhos o tronco para cima, a folhagem dele misturase à folhagem geral e é de novo o sincretismo. Só o tronco se destaca, se individualiza. Tal é o Mayombe, os gigantes só o são em  parte, ao nível do tronco, o resto confunde se na massa. Tal o homem. As impressões visuais são menos nítidas e a mancha verde predominante faz esbater progressivamente a claridade do tronco da amoreira gigante. As manchas verdes são cada vez mais sobrepostas, mas, num sobressalto, o tronco da amoreira ainda se afirma, debatendo se. Tal é a vida.

[…]

 Os olhos de Sem Medo ficaram abertos, contemplando o tronco já invisível do gigante que para sempre desaparecera no seu elemento verde.

Pepetela, Mayombe.

 Considerando-se o excerto no contexto de Mayombe , os paralelos que nele são estabelecidos entre aspectos da natureza e da vida humana podem ser interpretados como uma

a) reflexão relacionada ao próprio Comandante Sem Medo e a seu dilema característico entre a valorização do indivíduo e o engajamento emum projeto eminentemente

b) caracterização flagrante da dificuldade de aceder ao plano do raciocínio abstrato, típica da atitude pragmática do militante revolucionário.

c) figuração da harmonia que reina no mundo natural, em contraste com as dissensões que caracterizam as relações humanas, notadamente nas zonas urbanizadas.

d) representação do juízo do Comissário a respeito da manifesta incapacidade que tem o Comandante Sem Medo de ultrapassar o dogmatismo doutrinário.

e) crítica esclarecida à mentalidade animista   que tende a personificar os elementos da natureza   e ao tribalismo, ainda muito difundidos entre os guerrilheiros do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

 

Português, interpretação de texto, história

Letra A